A Bienal de Arte Contemporânea, o clássico festival de música, Rock Am Ring, e a Berlim Fashion Week, são constantes palcos para novas inspirações que movem a arte pelo país. Definitivamente as trágicas participações em duas guerras mundiais e a construção do muro de Berlim em 1961, tornaram a Alemanha um cenário ideal para o nascimento de diferentes estilos artísticos, musicais e fashionistas.
O país sempre se inspirou na própria história. A moda alemã defende constantemente a liberdade de criação, não se prendendo a tendências estabelecidas por revistas e lançamentos de grifes fashionistas. A estilista Aline Celi é atualmente um grande exemplo desse discurso.
Focada em unir sustentabilidade com glamour, a designer brasileira que deixou o país para estudar moda na Alemanha conquistou por dois anos consecutivos (2013-2014) seu passe para desfilar sua coleção na Berlim Fashion Week. “A participação foi muito natural. Acredito que a técnica sustentável foi o grande diferencial para o convite surgir. Após a participação percebi que é exatamente isso o que procuram, o inusitado”, defende Celi.
Por meio do estilo Betzingen, surgiram em 1850 os primeiros trajes tipicamente alemães. Originado na região de Baden-Württemberg, camponeses criaram peças como o dirndl (vestido composto por corpete, blusa e avental) e a lederhosen (calça de couro). O intuito era que elas os protegessem do frio, e fossem práticas de se limpar. Com o passar dos anos serviram de inspiração para a criação de novas peças que abrigariam maior conforto e modernidade.
As próximas mudanças significativas aconteceram em 1933, com o início do período nazista. A visão conservadora do partido fez com que a liberdade de expressão se findasse, predominando assim o estilo clássico. A moda se limitou durante anos a homens trajados em ternos e cardigans, enquanto vestidos, casacos e belos penteados eram referência para as mulheres alemãs.
A famosa adaptação da obra literária A Menina que Roubava Livros, apresenta um figurino semelhante ao da época. Situado no decorrer da segunda guerra mundial, o filme conta a história de Liesel, uma garota que aprende a ler graças aos livros que rouba. Enquanto vive essa aventura, a menina aprende a lidar com o complicado momento político de seu país.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial e a chegada da Guerra Fria, a Alemanha começa a enfrentar uma nova adversidade: o muro de Berlim. A construção não apenas separava o território do país, como também famílias e, claro, empresas. Exemplo disso é a ZEISS, empresa responsável por fornecer suas lentes para grandes armações no universo fashion, que sofreu uma divisão durante este período. Como consequência, foram criadas na época duas unidades da mesma companhia, uma unidade em cada lado do país.
Apesar da tal eventualidade, neste período a ZEISS foi a responsável por uma revolução no mundo óptico, fornecendo em primeira mão as lentes anti-reflexo. A tecnologia presente no produto permitia não só uma visão mais clara para a pessoa que a usasse como também para as que a enxergassem. Com a conquista, diferentes marcas puderam impulsionar o design de seus produtos, oferecendo uma experiência inovadora aos seus clientes. Anos depois a empresa alemã alcançou um novo feito, por meio da criação das lentes fotossensíveis. Tecnologia que as permite se adaptar a luminosidade presente em diferentes ambientes.
Durante a Guerra Fria, a Alemanha Oriental se estabeleceu perante os padrões socialistas. Todas as roupas usadas durante esta época deveriam servir apenas para cobrir o corpo. Cortes retos, modelagens simples e cores neutras, desvendavam a uniformidade que a visão política pretendia imprimir. Contudo, a sociedade já não se sentia atraída pela proposta. Com os anos, mulheres aprenderam a costurar, para enfim comercializar peças ilegalmente por meio de galpões abandonados e fundos de imóveis antigos.
A grife “Chic, Charmant und Daverhaft” é um resultado de tal rebelião. Com a proposta de ir contra a ideologia da época, a marca criava peças inovadoras como forma de protesto à moda presente nas ruas. Em 1983, uma festa privada no apartamento da fotógrafa Helga Paris, dava origem a este grupo de estilistas. Nomes como Yvonne Bergemann, Esther Friedemann, Domenique Windisch, Sabine von Oettingen, Robert e Jenny Paris, se tornaram parte deste grupo fashionista.
Em 1989 tudo se transforma. A queda do muro de Berlim traz a unificação do ocidente com o oriente. A princípio, tal fusão causou um forte estranhamento para muitos cidadãos, mas com os anos ela se tornou combustível para a reinvenção do seu próprio estilo. A brasileira Giuliana Esteves vive na cidade de Bonn há aproximadamente um ano e meio, e ao observar o estilo dos alemães explica: “Eu vejo que eles são muito livres. Eu já vi de tudo, cada um usa o que quiser. O estilo em si tende mais para o básico, mas sempre com muita presença e elegância”.
Usando como pano de fundo o impetuoso Portão de Brandemburgo, há 10 anos a capital alemã oficializa o seu maior investimento no mercado têxtil, a Berlim Fashion Week. Desde sua inauguração, cinco estilistas independentes têm a chance de desfilar pela passarela seus trabalhos, graças aos fomentos disponibilizados pelo governo alemão. Marcas como Hugo Boss, Vivienne Westwood, Puma e Michael Michalsky já apresentaram seus trabalhos ao lado de jovens iniciantes da área. “Acredito que para se destacar no mercado alemão, a originalidade é essencial. Sinto que me encaixo aqui pelo combinação que sempre crio entre o estilo clássico e a estética clean”, defende Celi ao ser questionada sobre sua conquista no mercado estrangeiro.
Aliás, essa é uma ótima definição para a moda alemã, que carrega referências históricas de peças e trajes que representaram o comportamento de gerações. A preferência por não seguir tendências e estilos pré-estabelecidos concede a liberdade para cada cidadão externar da sua forma a maneira como quer se trajar.